As conquistas sociais sofrem constantes ataques das classes dominantes, especialmente as ligadas à educação pública. Segundo os especialistas, uma das interferências mais impactantes é a exercida por associações empresariais que atuam junto a municípios, estados e União com o objetivo de influenciar o ensino.
O papel desempenhado pelo “Movimento Todos pela Educação”, de base empresarial, cuja pretensão é formular programas e estabelecer metas para as escolas como se fossem empresas, tem sido um dos principais alvos de críticas dos especialistas, como a professora Virgínia Fontes, docente da pós-graduação em História da Universidade Federal Fluminense (UFF). Ela explica que essas entidades vendem projetos de gestão, além de programas educativos e de avaliação aos estados.
Esse processo atinge, segundo Virgínia, todas as redes de educação pública, inclusive escolas do campo. Entidades como a Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG) ou o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) fornecem treinamentos para docentes e material didático para implementar disciplinas que “são verdadeiras propagandas empresariais nos espaços de ensino rurais”, salienta.
A adoção legal de escolas públicas por empresas privadas e a formulação de políticas educacionais públicas por entidades empresariais, ainda que sem fins aparentemente lucrativos, segundo Virginia, é uma situação escandalosa. “O problema é que essa doação é apenas aparente, já que as fundações e entidades sem fins lucrativos, inclusive as empresariais, têm enormes abatimentos de impostos e atuam como um estado paralelo”, crítica.
Virgínia aponta que todo o sistema eleitoral se torna desnecessário, pois o voto popular é desqualificado pela oferta de recursos empresariais ‘por fora’ aos Estados e municípios. “Não estou falando necessariamente de corrupção, mas de um funcionamento normalizado, no qual a carência de recursos públicos estimula a ‘ajuda’ empresarial. Evidentemente que é uma porta aberta para procedimentos corruptos”, lamenta a docente da UFF.
Para Virgínia, as classes dominantes jamais se preocuparam efetivamente com a educação popular, mas sim com o treinamento de mão de obra. Essa interferência resultou na suposição de que algumas pessoas nasceram melhores do que outras porque descendem de famílias abastadas. “Na ausência de empregos, as massas populares são induzidas a aceitarem sua má sorte ou a lamentar a falta de qualidades para trabalhar”, ressalta a pesquisadora.
Esperançosa, Virgína Fontes afirma saber que é possível viver de outra maneira e lembra que houve situações e processos nos quais parcelas da rede pública conseguiram maior autonomização, especialmente nos momentos de impulso das lutas populares, e que além disso, em diversos países a educação pública não está à mercê do patronato.
Para a especialista, apesar de seu imenso poder, as classes dominantes brasileiras, cujo topo concentra metade da riqueza do país, não conseguirá exercer essa dominação para sempre, pois há intensos esforços contra as formas abertas e veladas de privatização da existência humana